Um desabafo sobre a ausência do Estado

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Um dos temas que o Guará precisa se debruçar nos próximos anos para podermos reverter o que tem acontecido na cidade. Ela nasceu planejada, tem quadras residenciais, majoritariamente horizontais. No Guará I temos prédios no meio das casas com pracinhas, áreas verdes, enquanto no Guará II as quadras horizontais e verticais são bem separadas.

Nos últimos anos tivemos algumas mudanças porque a demanda mudou bastante. Temos alguns problemas sérios de urbanismo e que têm causado problemas de segurança, de gestão de resíduos, de trânsitos e vários outros problemas que vêm justamente da falta de ordenamento territorial do Guará, da ausência do Estado, de regulação de várias áreas e de legislação.

Por exemplo, hoje temos o Pólo de Modas do Guará, uma área que era para o DF, para a indústria e que seus lotes foram subsidiados pelo Governo para que houvesse geração de emprego.

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Esse setor demorou muito para receber a sua infraestrutura, então por muitos anos ele ficou sem asfalto, esgoto inviabilizando o funcionamento das empresas.

Com o tempo, surgiu uma demanda no Guará, por residências populares ou mais baratas. Temos passado por um processo de gentrificação muito ruim. É óbvio que a cidade está se valorizando muito, como o valor do metro quadrado, o que é uma questão natural tanto pela localização, qualidade de vida, então é natural que as pessoas queiram morar na cidade e que as casas e os lotes estejam se valorizando.

Mas estamos expulsando os trabalhadores do Guará. Então aquele trabalhador que não consegue comprar uma casa de 2 milhões ou de pagar 3-4 mil de aluguel, não tem onde morar nessa cidade. Assim ela se torna menos inclusiva e acolhedora.

Então temos um ambiente muito difícil para as empresas e para quem trabalha no Guará, naturalmente se cria uma demanda muito grande por residências populares. Essas áreas industriais e comerciais, como o Pólo de Modas e o Setor de Oficinas com o tempo, foram se tornando áreas residenciais, mas esse processo foi acontecendo sem a presença do Estado.

Sem qualquer regulamentação, os prédios foram construídos sem alvará, os apartamentos não têm habite-se, tornando-se impossíveis de financiar e não podem ser alugados por imobiliárias por causa da documentação. Então hoje temos um setor que, pela ausência do Estado, tem problemas como os já citados acima, além de vários outros.

Por isso, precisamos urgentemente regularizar porque é preciso que tenhamos locais para os trabalhadores. É importante que as pessoas vivam próximo do seu local de trabalho.

Para as empresas é difícil contratar pessoas porque boa parte dos trabalhadores do Guará, principalmente do setor de gastronomia, moram muito longe e sabemos que a mobilidade no DF e interna da cidade é um problema muito grande.

Então quando não se tem esses locais próximos ao Guará onde se possa acomodar a população que precisam desses locais. Hoje temos essas áreas que possuem essas lacunas onde o Estado vai deixando acontecer e ficar do jeito que está.

Ao pedir a regularização dessas áreas urgentemente, não é regular uma invasão. Existe uma mudança no uso do espaço. Temos que entender que não vamos derrubar casas e prédios. A partir do momento que regularizamos esses espaços muito dinheiro é injetado na economia porque os lotes, casas e prédios passam a valer muito mais, começam a poder serem vendidos financiados pelos bancos públicos ou privados e as pessoas que vivem ali passam a ser proprietárias deles e, naturalmente, cuidar mais da região onde estão.

Isso não é um processo novo. Ele iniciou quando as casas do Guará começaram a ter casas de fundo por causa da família que cresceu, do filho que agora tem a sua própria família, outras pessoas que vêm de fora.

Depois veio as kitnets em cima dos comércios e isso não é um processo recente só não foi dada a devida atenção pelo Estado que é dar espaços para que a cidade cresça de forma saudável e inclusiva e não seja uma cidade que tenha apenas moradias milionárias, que seja uma cidade onde as pessoas possam viver e trabalhar.

O modelo de administração que o governo do GDF traz mais malefícios do que benefícios para a cidade. Hoje existe uma lei que toda arrecadação de ocupação de área pública será revertida no orçamento da administração regional.

Os comércios de quadra do Guará têm lojas pequenas, mas com o tempo elas precisaram crescer e as atividades mudaram. Então as lojas começaram a ocupar as calçadas ou áreas inteiras. O ideal seria que essa ocupação fosse regulamentada, regularizada e que se pagasse por essa ocupação, uma taxa pequena, mas justa.

A mesma coisa ocorre com as casas de beco e as em volta do calçadão. Invadiram, tomaram parte do espaço do beco, ocuparam e não pagam o uso dessa área pública. Enquanto, para reformar uma praça, uma quadra que é um trabalho imenso da comunidade onde os líderes comunitários das quadras vão ao gabinete do deputado, fazem toda aquela peregrinação pelas secretarias pedindo 100-200 mil, hoje o Guará deixa de arrecadar 12 milhões por ano de área pública só de empresas, sem contar com as residências.

O orçamento total da administração é de 12 milhões, mas ela gasta todo com a própria existência. Então não temos nada de investimento na cidade, então 12 milhões por ano poderiam ter sido investidos sem aumentar a arrecadação, só pagaria quem ocupa a área pública.

O melhor seria poder colocar regras para essa ocupação porque quando o Estado não fiscaliza as pessoas vão ocupando do jeito que querem sem seguir nenhuma regra. Assim temos centenas de quiosques na cidade ocupando as praças da forma que querem.

Temos quiosques muito maiores do que muitas lojas da cidade, com o esgoto e água ligados sabe-se lá onde porque não estavam no planejamento da cidade, o Estado não cobra deles e não há nenhuma contrapartida da comunidade. Então perdemos um pedaço da praça e da área pública para uma empresa e ela não devolve para a comunidade e não pode ser reinvestido e o problema é apenas da Lei. Precisamos tornar a Lei viável porque a que temos hoje de cobrança de área pública foge da área constitucional e não há fiscalização. A agência de fiscalização não consegue fiscalizar porque o empresário, mesmo se quiser, não consegue pagar a área pública.

Já existem alternativas que aconteceram em 1996, no governo Cristóvão Buarque, onde foi conseguido negociar o aumento da arrecadação para conscientizar os moradores de que era importante pagar pela área pública que seria reinvestida na cidade e muita coisa foi feita no Guará.

Acredito que devemos repensar o território de forma a tornar essas empresas viáveis. Então temos que repensar em uma forma dos trabalhadores morarem na cidade, em uma forma de ocupar o comércio com inteligência, de preservar o que já temos hoje, como o calçadão, o parque, a Feira do Guará.

Olha a ausência do Estado na Feira, uma das mais importantes do DF porque é bem tradicional, típica com todos os elementos de misturar o Brasil. Mas ao visitá-la é perceptível a ausência do Estado. Ela não está limpa, sofre com os ambulantes presentes, com a desorganização dentro da feira, problemas de infraestrutura.

São problemas que não a capacita para ser vendida para fora. Temos uma relação muito afetiva com a feira, mas queríamos poder vendê-la melhor. Para isso, é preciso que o Estado esteja mais presente, a cidade e todo o Distrito Federal estão muito abandonados.

Hoje, a administração funciona como um “cartório”. O administrador não tem orçamento porque o que chega direto para ele é todo consumido na manutenção da própria administração.

Todo investimento depende dos deputados e das emendas parlamentares, esses investimentos sequer são feitos pela administração porque ela não tem poder de contratar e nem de licitar mais nada, então depende de outros órgãos, como a NOVACAP, TERRACAP. Ou seja, vamos à administração apenas para protocolar as coisas. Protocolar para tirar o alvará, o habite-se, como um cartório.

É uma pena porque se tivéssemos de fato uma administração presente que fosse representante do Poder Executivo e tivesse poder de, ao menos, levar as demandas do cidadão para os diversos órgãos, teríamos um Estado muito mais presente.

Isso não é uma crítica à gestão atual. É uma crítica ao formato de administração que se chegou e foi perdendo valor gradualmente. Hoje o Governo está descentralizado e não tem nenhuma “cabeça” nas cidades.

Acredito que para ser economicamente fértil, o empresário e o guaraense precisam poder consumir mais no Guará, para a economia circular melhor internamente, para que haja mais segurança de investimento na cidade, repensar a ocupação do nosso território e fazê-lo com mais qualidade para que, pelo menos, consigamos discutir novas leis que se adequem à realidade do Guará.

A ausência do Estado tem sido muito danosa para o ordenamento do nosso território. A cidade está muito bagunçada e a culpa não é apenas dos moradores, mas principalmente do Estado que não dá instrumentos para organizarmos a cidade.

Consumir localmente

                Viver plenamente a cidade não só viver na cidade, apenas dormir. Há muito tempo o Guará não é apenas uma cidade-dormitório. Viver plenamente o local onde você mora, comprar no mercadinho e na padaria da esquina, do artesão da cidade é o que há de mais sustentável, não só ambientalmente falando, mas comprar localmente é manter o dinheiro na sua cidade, incentivar os moradores a prosperar.

                A melhor forma de preservar o Parque do Guará é frequentá-lo. É preciso que a população se aproprie dele, que vá ao Parque, cobre do Estado ou do desenvolvimento privado, que a própria população crie alternativas e iniciativas que melhorem o espaço público.

                Precisamos falar com os guaraenses, consumir a gastronomia local. É muito melhor que possamos sair para comer, beber e se divertir dentro do Guará, não apenas por causa da Lei Seca, mas para incentivar outras pessoas a conhecerem cada cantinho, restaurante, local.

O que podemos fazer hoje, que é o que o Hackacity já está fazendo ao incentivar a arte, os projetos culturais do Guará. Chamar a atenção para a cidade, para que os guaraenses possam defendê-la. Incentivar para que as pessoas preservem melhor a cidade e só faremos isso vivendo-a. Então convido todos a tentarem “vender o nosso peixe”, indicar sempre o comércio do Guará para alguma coisa e se tornar uma comunidade mais ativa.

Rafael Souza

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